27.12.10

Voltas

Às vezes regressamos a lugares onde nunca antes estivemos, assim como às vezes regressamos a pessoas que nunca antes tivemos. E mesmo assim sentimos imediatamente que pertencemos, somos invadidos pela sensação de conforto, aquela que nos diz que nunca dali saímos, que nunca nos separamos. Temos simplesmente a certeza que somos, e regressamos.

23.12.10

Pointless

Há mulheres que não precisam de pretexto para se arranjarem. Sem mais nem menos pegam na lingerie mais bonita e vestem-na, só para elas. Calçam as meias de liga e sentem-se bem, só para elas. Olham-se ao espelho e não, não é preciso maquilhagem. Apetece aquele vestido preto e não saem sem o sapato de salto alto. Não há nenhuma ocasião especial, não é para ninguém em especial. É somente para dentro, para um sentimento muito delas, que provavelmente ninguém entende e não faz diferença. Hoje, eu sou essa mulher. Estou triste, deprimida, vazia de entusiasmo, sim estou. Mas sinto-me bem comigo, vesti-me e arranjei-me para mim, só para mim. E agora? Expliquem-me isto.

20.12.10

Para acabar o ano em beleza

Parece que estou deprimida, parece. Parece que é uma depressão, parece. Pois se me perguntou eu respondi, que acordo com vontade de não acordar, que não descortino interesse em nada, que nunca me apetece ir trabalhar. Que confundo as coisas, que acho que fiz o que não fiz e que não fiz o que fiz. Que me esqueço, sim, esqueço-me de coisas das quais não devia esquecer-me. Que me faz falta estar sozinha, que me apetece estar sozinha, que quero estar sozinha e que nunca estou sozinha. Que deixei de fumar há mais de três meses, e que nestes três meses chorei mais do que na minha vida toda, o que não é difícil porque nunca fui mulher de chorar por qualquer coisa, aliás nunca fui mulher de chorar por quase nada e que nestes três meses me fartei de chorar, mas que já não choro, tanto. Que reencontrei uma pessoa que conheço há muitos anos e que este reencontro me pertubou, me abanou e me arrasou, mas já consigo respirar outra vez. Parece que é uma depressão, parece, quase como que a pedir-me confirmação. Sei lá se é uma depressão, não sou médica, foi por isso que cá vim, isso pergunto-lhe eu. É. É uma depressão.

13.12.10

Heart beat

Nada bate o bater de um coração. Que acelera na ansiedade de ver, que dispara com a adrenalina de tocar. Nada bate esse momento em que já não chega a mão para o sentir, é preciso encostar-se o ouvido ao peito para o escutar, para absorver a vibração, permitindo que trespasse o nosso peito e invada o nosso corpo. Sentes? Sim, sinto. O bater de um coração, o ouvir o bater de um coração com o ouvido encostado ao peito desata qualquer nó, derruba qualquer barreira e aproxima o coração que bate do coração que ouve. O bater de um coração é, ao fim e ao cabo, a vida que temos, a vida que damos, e a que recebemos.

2.12.10

Tangerina

O cheiro é maravilhoso. Apetece encher a boca, mas não é para comer. É de massajar, é de acariciar, é de envolver, é de... nem sei. Faltam-me as palavras mas sobram-me as sensações. Desperta-me os sentidos e faz-me sentir bem. Sinto-me sexy, sinto-me doce, sinto-me desejável. Regalo-me com um creme que cheira tão bem que se pudesse comia-o. Cheira a tangerina, e combinado com o gel duche, deixa-me a pele tão macia, brilhante e cheirosa que me apetece trincar-me,  apetece-me tocar-me, uma loucura. O meu creme cheira a tangerina, faz-me sentir bem comigo, faz-me sorrir, e desperta-me os sentidos. Tenho um gajo assim, tal e qual o creme, faz-me tão bem e é tão bom que apetece comer só que não é para comer.  Também cheira bem, mas não é a tangerina.

30.11.10

Turning point

Às vezes somos como o S. Tomé. Precisamos de ver para crer. E depois de vermos e ouvirmos parece que tudo muda. Parece que as coisas tomam outros contornos, parece que de repente, só por causa de uns breves minutos em que vimos e ouvimos, a realidade torce-se e transforma-se numa outra. A que era nossa passa a ser de outros e a dos outros passa a ser a nossa. E o que antes sabíamos ser verdade mas esperávamos que fosse mentira passa a ser mesmo verdade. Mesmo muito verdade. E esta percepção retira-nos um certo peso, e retira-nos uma certa mágoa. Ficamos aliviados do nosso fardo e a vida parece mais fácil. E é. Resumindo, é extremamente simples. Bastou-me enviar um simples e-mail e esperar uma semana pela resposta. Esta semana foi determinante. Esta ausência de resposta foi determinante. Chegou para que quando veio a resposta, o que queria dizer já não fosse bem a mesma coisa. O que disse foi condicionado pela ausência de resposta. O que disse foi que se iniciou dentro de mim um processo muito importante. Iniciou-se o processo de passar à frente, virar a página, encerrar o capítulo, o que se lhe queira chamar. O que é certo é que estou cada vez mais longe. E esta minha nova etapa, gerou um outro fenómeno muito interessante, que contarei mais tarde.

15.11.10

Aviso

Temporariamente fora de serviço.

Até breve.

Espero.

12.11.10

Under the stars

Se eu acreditasse nestas merdas ia já a correr ver o que é que isto quer dizer. Pois bem, noto um padrão que de certeza que quer dizer qualquer coisa. O meu ex-marido e o tipo por quem me perdi este Verão são do mesmo signo. Depois, os homens que intelectualmente acho mais estimulantes são também do mesmo signo. Aposto que alguém encontra e me dá a explicação para isto, mas custa-me a acreditar que o signo do Zodíaco condicione assim o carácter ou a inteligência, ou mesmo o sentido de humor de uma pessoa.

11.11.10

Just what I needed

Pó de talco, algodão.
Relva acabada de cortar.
Uma cama feita de lavado.
Uma manta e uma lareira.
Um abraço apertado.
Um par de mãos quentes que me seguram no rosto.
Um copo de vinho.
Espreguiçar-me ao sol.
Um corpo colado ao meu.
Um beijo na nuca, mesmo na linha do cabelo.
Um beijo nas costas, mesmo ali no fundo, onde faz cócegas.
Uma gargalhada ao acordar.

Tu fazes-me pensar em tudo isto. Só coisas boas, muito boas.
Obrigada.

9.11.10

Frase do dia (a minha)

"É um bocado estranho porque tenho o tempo tão ocupado, tenho sempre tanta coisa para fazer e ao mesmo tempo sinto que não faço nada de jeito. Puta de estupidez."

7.11.10

Fardamento

Hoje houve fardamento. É o que se chama a terem estado todos os escuteiros da freguesia, devidamente fardados, do mais pequenino ao mais velho, na missa das onze. Com as bandeiras do agrupamento levantadas com orgulho. Achei muito bom, porque estava o professor, que por acaso é o director do agrupamento das escolas primárias sentado ao lado do tecelão, e por acaso o tecelão, na hierarquia dos escuteiros está acima do professor. Também estavam os moços, lado a lado, todos iguais com o lenço da mesma cor, os universitários e os operários fabris. Os putos, uma maravilha, sejam filhos do sapateiro ou do presidente da junta, do agricultor ou do advogado, é tudo igual. Gostei. E tive pena, mais uma vez, que os meus macaquitos não queiram ser escuteiros. O princípio da coisa é fixe. Seja qual for a proveniência, a família, a profissão, a condição financeira, ali não há distinções, a farda é igual e apaga as diferenças de todas as espécies. A única coisa que conta é a cor do lenço, e essa vai mudando com o passar dos anos e com o mérito de cada um. Ponho o meu pescoço como ali ninguém suborna ninguém para que o lenço mude de cor mais depressa.

6.11.10

Et voilà, comme promis

Lady Marmelada



Miss Geleia




O grande circulava à minha volta chegando-me todos os utensílios que iam sendo necessários e atento a todos os meus movimentos, absorvia todo o ritual com visível prazer.

O pequeno oscilava entre o espaço à volta do fogão onde andávamos eu e o irmão, e o cesto da gata, que é grande o suficiente para ele lá se meter dentro com a gata ao colo.

No fim, rapamos as panelas e lambemos as colheres, todos três, como sempre.

No próximo fim-de-semana, há mais.



Cala-te

Amanhã faz dois meses que não fumo (estranho porque mais dois dias e são nove semanas, mas ninguém contradiga o calendário). O primeiro mês foi absolutamente fodido, o segundo foi bastante suportável. Há uma semana que tudo ficou diferente. Desde aquele dia em que quase que fumava um cigarro. Na minha cabeça só me vejo a fumar. Vejo-me a entrar numa tabacaria ou num quiosque e a comprar um maço de Marlboro Lights, não, que lhe mudaram o nome, Marlboro Gold, e um isqueiro e a acender um cigarro. Penso nisto constantemente. Ainda agora acabei de almoçar e fiz o percurso para o escritório a pé, sozinha e pensei, um cigarro, ia tão bem agora um cigarro, ninguém iria saber. Estou a quebrar, sinto-me a ceder. O meu cérebro já está às voltas a tentar arranjar um esquema para me enganar. Já sei como é. Já ouço aquela voz from the back of my head a dizer-me: fuma, vá, se te apetece, ninguém precisa de saber, vai comprar, é só um, escondes o maço no carro, ninguém descobre, vá, vai, tu queres, bem sabes que queres. E é isto, a puta da voz não se cala. Mandem-na calar, mandem-na calar senão ainda lhe espeto dois pares de estalos.

3.11.10

Todos iguais

Serve-me um qualquer corpo, um qualquer rosto, uma qualquer voz, fecho os olhos ou mesmo com eles abertos e tanto me faz, serve-me um qualquer homem para foder, são todos iguais, serve-me qualquer um, o único que quero não tenho, os outros são todos iguais.

2.11.10

Fraquezas

Ontem fraquejei e quase que fumei um cigarro, felizmente a minha amiga impediu-me. Sentia-me tão mal que mandava às urtigas todo o esforço que fiz este tempo todo para não fumar. Por uns minutos de prazer deitaria tudo a perder. Depois, já sei, sentir-me-ia mal, muito mal, uma fraca, uma merda. Por uns minutos de prazer iria sentir-me uma merda durante muitos minutos, muitas horas, muitos dias. Burra. Felizmente a minha amiga impediu-me. Felizmente passou-me a ideia, foi um momento, um repente. Acho que estou a enlouquecer. Obrigada G.

31.10.10

Prioridades

A noite de ontem deve ter-me custado uns 150€, mais coisa menos coisa. Gasolina, portagens, jantar e copos, tudo junto a coisa não andou longe, mas, de longe, antes euros gastos em bons jantares e bons copos com amigos do que em roupas e sapatos e malas e essas coisas todas que se compram em lojas. Gostos...

27.10.10

Tradições

Outra das coisas que à primeira vista ninguém imagina é que eu, todos os anos por esta altura, faço marmelada. Daquela que se mete em tigelas de barro e se deixa a secar à janela, ao Sol. Daquela que liberta um cheirinho maravilhoso que inunda a casa toda enquanto ferve ao lume. Daquela que invariavelmente me garante os meus filhos à minha volta na cozinha enquanto mexo a panela com a colher de pau, enquanto encho as tigelas para depois, contentíssimos raparem e lamberem a panela e a colher de pau. Daquela que é feita com marmelos e açúcar e muito, muito amor. Adoro.

26.10.10

Pensamento do dia

"É dificil comerem-me de cebolada, muito difícil. Mais depressa me comem com chantilly do que de cebolada."

(Este foi o "meu" pensamento do dia, eu é que pensei esta merda, fui eu. Isto está lindo, sim senhor)

25.10.10

Quem não está...

Outra maravilhosa característica desta minha cativante personalidade é que, apesar de haver pessoas com as quais gostaria imenso de conviver mais, não convivendo penso sempre: quem está, está, quem não está, estivesse. E amigos na mesma, nem chateada fico. A sério, é uma categoria.

24.10.10

Missa das 11

Hoje na missa das 11, sim levo os meus filhos à missa, sim o pai, apesar de não ter tido uma educação católica como eu tive, também os leva à missa quando estão com ele e sim andam os dois na catequese. Não lhes faz mal absolutamente nenhum e terão muito tempo para questionar, abandonar, renegar, e escolher outra coisa qualquer ou não escolher nada. Por agora fica assim porque além de, repito, não lhes fazer mal nenhum, poupamos um grandessíssimo desgosto à avó e também somos coerentes porque se os meninos fazem a primeira comunhão com  direito a festa de família como manda a sapatilha, há que ser minimamente coerente e dar algum seguimento à coisa. Bom, hoje na missa das 11, eu toda fodida porque estive numa festa fantástica até às 5 da matina e obviamente que estava cheinha de sono e com o corpo todo moidinho, o maior a curtir aquilo à brava, sim o grande curte a missa, e o pequeno a achar a seca de sempre. Já perto do fim, ao ver o padre a guardar as coisas todas dentro do sacrário, o pequeno aproxima-se de mim e com as duas mãos em concha à volta da boca que encostou ao meu ouvido diz-me assim:

- Mãe, ali dentro, onde ele está a guardar o pão, é quentinho não é?
- Não filho, claro que não.
- Mas então aquilo não é um forno?

Não sei como me segurei.

21.10.10

Rosita

Quando casou, toda a gente disse que a Rosita tinha tido muita sorte. O marido era uma estampa. E por acaso era, lembro-me perfeitamente de ser miúda e de achar o indivíduo um homem muito bonito. A Rosita também era bonita, faziam um casal lindo de se ver. Hoje, a Rosita está mais velha obviamente e o rosto transformou-se num rosto sofrido e gasto. O marido continua muito bem parecido, é normal. O tipo não trabalha, passa o dia na rua ou no café a coçá-los, enquanto a Rosita trabalha que nem uma moura para o manter e aos dois filhos quase adultos. Trabalha Rosita, que a estampa do teu marido gasta.

19.10.10

Os meus lençóis.

Tenho saudades da minha cama. Mais do que qualquer coisa lá de casa, falta-me a minha cama, faltam-me os meus lençóis. Os meus lençóis são parte de mim. Na suavidade dos meus lençóis amei, na solidão dos meus lençóis chorei e na imensidão dos meus lençóis desejei. Desejei tudo o que uma mulher pode desejar, um corpo de um homem junto ao seu ou uma existência mais feliz. Forcei o descanso e escorracei memórias, reneguei o mundo todo e reconciliei-me comigo, tantas vezes. Os lençóis para onde entraram os meu filhos tantas vezes de noite, ignorando o amor feito pouco tempo antes. Quando na minha cama se deixou de fazer amor passou a fazer-me impressão que os meus filhos lá entrassem naqueles lençóis, sujos, já não havia amor. Sossegados, como anjos dormindo entre o pai e a mãe, eu olhava-os e pensava, nesta cama já não se faz amor. O pai talvez ame a mãe mas a mãe não ama o pai, aqui já não se faz amor. Os meus filhos dormiram muitas vezes numa cama cheia de pai e de mãe, mas completamente vazia de amor.

Saturday night

Aconteceu-me uma coisa estranhíssima no Sábado passado, não este que acabou de passar, no Sábado passado mesmo, o da semana passada. Entendido? Bom, adiante. No Sábado passado jantei em casa do meu compadre que cozinha muito bem. Comemos e bebemos muito bem. Depois de jantar apareceu o meu irmão, um primo nosso e um amigo deles. Bota música e vai daí, o meu compadre teve a excelente ideia de preparar umas bebidas. Muito bem, vai daí, emborquei duas vodkas Absolut com Sumol de laranja, que foi o sumo que se arranjou no café lá de baixo. Bebida altamente improvável, mas que escorregou que foi uma maravilha. Resultado: fomos depois à festa de reabertura da discoteca cá do sítio, onde me deparei com um tipo que nunca antes tinha visto, boa pinta por sinal, e que me olhava com aquele olhar que já aqui descrevi, o olhar que me faz voar, o olhar desafiador. Arrependi-me imediatamente da vodka já consumida, mas não havia volta a dar-lhe, e este, com este olhar e esta pintarola, não vai a lado nenhum, fica já aqui, pensei. E ficou. Conversamos, dançamos e no fim trocamos de nº de telefone. Só um pequeno problema, no dia seguinte não conseguia lembrar-me do rosto dele. Lembrava-me da conversa, lembrava-me de o ter achado um giraço, lembrava-me do olhar que me fez levantar voo e lembrava-me que ele cheirava bem. Do rosto, nada - lá está, vodka a mais - não me lembrava do rosto, uma chatice. Como expliquei no início, tudo isto aconteceu no Sábado passado, o da semana passada, porque este Sábado, este que acabou de passar, o tipo telefonou-me e eu, claro, eu quis ir confirmar se o que me lembrava batia certo. Bate tudo certo, simpático, giro, cheiroso, e desafiador. Isto promete. Ui, se promete!

18.10.10

Friday night

O fim de semana começou com um concerto muito intimista deste senhor que apesar de madurinho continua um charme, uma doçura que só visto. Foram duas horas a ouvi-lo tocar que souberam a uma tarde passada num sofá, à lareira com um copo de vinho e um albúm de fotografias antigas. Muito bom. Mesmo.

(Lloyd Cole - 15/10/2010)

15.10.10

Farinha

Há mulheres que são parolas e serão parolas toda a vida. Podem arranjar o cabelo, podem vestir as melhores roupas e calçar os melhores sapatos que serão sempre parolas. Mas essas, não têm culpa, não podem mudar o código genético que lhes saiu na rifa. Podem por outro lado cultivar a simpatia, a gentileza, podem desenvolver características que as tornem atraentes, mas só se o tal código genético também lá tiver o bom material. É preciso boa farinha para fazer bom pão. Há outras mulheres que podem até parecer boazinhas, que são simpáticas e humildes e depois, atingindo o objectivo a que se propuseram na maior parte das vezes recorrendo a meios menos correctos se transformam numas cabras impossíveis, arrogantes e cheias de manias, até tentam melhorar o aspecto e umas conseguem outras não, mas a massa, a farinha é ruim, e por mais que se amasse, nunca dará bom pão.

14.10.10

Exigências

Eu tenho uma maneira de ser um bocado fodida. É que não faço a coisa por menos. Levo sempre as coisas ao ponto das outras pessoas serem quase que obrigadas a mostrar o material de que são feitas. Não consigo fazer de outra maneira, ponho sempre as coisas num patamar em que ou se tem tomates ou não se tem, nunca facilito. Tenho sempre de ver até onde é que se vai, até que ponto se é verdadeiro, até que ponto se assume o que se é. Podia ser menos exigente, pois podia? Podia facilitar as merdas, pois podia? No imediato até lucrava mais, mas a longo prazo seria corrosivo, conheço-me. Pois é, eu podia ser uma mulher mais "fácil", podia, mas depois não era a mesma coisa.

12.10.10

Carga

Deixei o homem que me interessava ter por perto, deixei o tabaco, deixei a minha casa, é preciso estar de olho nas obras lá de casa, no emprego atravesso uma fase complicada, as aulas dão-me trabalho e consomem-me tempo que encontro com muito esforço. Isto tudo junto parece-me mais do que o que consigo aguentar, mas enquanto os meus rapazes estiverem bem, o resto todo que se foda, hei-de sobreviver.

Cinco semanas

Já não custa tanto, é verdade. Já não me lembro de todos os cigarros que fumava, lembro-me só de alguns. Ainda me apetece fumar, mas não da mesma forma violenta e dolorosa. Ainda me apetece fumar, mas bem sei que não posso, não fumo.

8.10.10

Engano

Pensei que as minhas aulas iriam ser um tédio, mas não. Ontem um professor claramente de esquerda e hoje uma professora claramente de direita, começa bem.Uma turma que prova que é muito mais difícil controlar adultos apalhaçados e com a mania que são espertos e engraçados do que putos insurrectos. É triste ver homens feitos armados em adolescentes parvos a mandar bocas aos profs e raparigas que já têm idade para ter juízo a rirem das piadolas deles como se fossem adolescentes aparvalhadas. A cota bem mais cota do que eu a fazer olhinhos ao prof, o tipo que tem a mania que tem personalidade e convicções fortes quando na verdade apenas usa clichés para argumentar tudo e mais alguma coisa. Os caladinhos que nunca abrem a boca e os fala-baratos. Uma tourada, portanto. O tema para debate: O governo francês expulsa os ciganos romenos. Ninguém achou piada nenhuma. Este tema é muito difícil diziam eles. Fui a única a concordar quando ontem o prof atirou o tema para o debate da próxima semana. Agora é pesquisar. Eu adorei, é um assunto tão rico, tão abrangente, levanta tantas questões de variadíssimas ordens, estou entusiasma. Mas sou mesmo só eu. E os profs.

5.10.10

E quase que me esquecia

De dizer que fui ao concerto dos U2 no domingo à noite e... tchan tchan tchan tchan... não fumei! Nem cigarros nem nada! Ah pois é! Em contra partida fartei-me de chorar. Em suma, adorei!

P.S. Devo esclarecer que as três pessoas que me acompanharam ao concerto choraram também, por isso posso concluir que a emoção não se deveu à minha especial dificuldade em conter as lágrimas neste momento. O concerto é que foi mesmo de cortar a respiração e de ir às lágrimas.

P.S. 2 - Das três pessoas, uma era uma gaja, e as outras duas eram gajos.

P.S. 3 - O meu irmão também lá estava e depois confessou-me que também chorou quando ouviu o Bono a cantar em italiano na Miss Sarajevo.

P.S: 4 - Acho que está tudo esclarecido, certo?

National Geographic

Assinei a revista durante sensivelmente 3 anos, devo ter cerca de 150 exemplares. Ao fim desses 3 anos fraquejei e cedi, anulei a assinatura que na altura nem era dinheiro por aí além. Todos os meses, quando chegava a revista pelo correio era um chorrilho de comentários negativos, que aquilo era dinheiro deitado fora, que eu nem lia aquilo, que só ocupava espaço, etc... É verdade que eu não li todos os exemplares de ponta a ponta, mas li a maior parte, e da outra parte li alguns artigos. Guardei-os e ali estão, protegidos do pó e arrumadinhos para não se estragarem durante as obras. Guarda-los-ei enquanto me apetecer. Acalento secretamente a esperança que venham a ser úteis aos rapazes nalgum trabalho de escola. E se não forem, quero que se lixe, são meus e quanto mais não seja, quando chegar à reforma terei ali centenas ou milhares de páginas de informação totalmente desactualizada mas cujas fotos continuarão magníficas para me entreter. Dava-me prazer ler a National Geographic, como hoje me dá prazer ver os documentários na televisão. Pergunto-me hoje qual teria sido a reacção se em vez da National Geographic me desse para gastar os 600 paus mensais em revistas de roupas e sapatos e malas e perfumes e maquilhagem e essas cenas... Na volta o maridinho teria achado mais piada, sei lá.

4.10.10

Introdução

Depois da poeira assentar vê-se muito melhor. E eu, não sou diferente dos outros e é à distância que vejo melhor. Depois de ter atravessado o período de adaptação a este novo estado, depois de ter concluído e aceite tudo o que concluí e aceitei, chegou a data estipulada para o corte com o tabaco. E foi o fim da macacada, não sei que raio de mutação genética se deu em mim que me tornei numa grandessíssima chorona. Era a minha mãe a falar-me num tom um nadinha mais... assim... coiso que eu pimba, logo as lágrimas nos olhos, eram os miúdos a portarem-se um bocadinho pior e eu a ter de impôr a ordem e eu pimba, logo as lágrimas nos olhos, e era vir-me à ideia qualquer coisa que metesse um determinado indivíduo que pimba, logo as lágrimas nos olhos. Isto do choro começou há sensivelmente 4 semanas, faz amanhã. O que nunca antes me incomodou passou a fazer-me chorar como uma Maria Madalena. Se pensarmos que nunca fui de chorar, de tal forma que atravessei todo o processo de separação e divórcio e o único gajo que me fez chorar foi o meu pai, e foi uma única vez quando batemos de frente e eu lhe garanti que ele nunca mais iria ver os netos porque ele achou que proibindo-me de lá entrar em casa (na dele, que eu também considero minha) me faria mudar de ideias quanto ao divórcio, é ainda mais absurdo. Mas o que é certo é que de há 4 semanas para cá acho que já chorei mais do que em 35 anos de vida. Acho não, tenho mesmo a certeza. O giro disto tudo é que as outras merdas todas já me passaram, já aguento bem a minha mãe e os miúdos. Agora, as cenas relativas ao indivíduo, não sei porquê, mas tenho a sensação que isto está apenas a começar.

1.10.10

Tudo

Tenho dias em que travo batalhas e tenho dias em que me estico em camas feitas de lavado. Tenho momentos do mais cerrado nevoeiro e tenho momentos de preguiça estendida na relva, ao sol. Há tempos de guerra e tempos de paz, há tempos de gargalhadas e tempos de lágrimas. Há tornados e há orvalho. Há espuma salgada de ondas e há terra, palha e pó. Há cheiro a fruta fresca e flores e há cheiro a sangue, ferro e fogo. Há isto tudo dentro de mim, mas pouca gente sabe, disfarço muito bem.

29.9.10

Dina

A Dina é mais ou menos da minha idade, um ou dois anos mais nova ou mais velha, não sei bem. A Dina teve meningite em pequenina, tem uma faltinha. Foi o que sempre ouvi dizer por lá, todas as vizinhas acenavam com a cabeça quando a Dina passava. Eu era amiga da Dina, fui sempre, desde pequenina. Só não me lembro da Dina ter a tal meningite, talvez fosse quando ainda era bebé. Foi a Dina que me contou que o pai era muito mau e que batia na mãe e nos irmãos e irmãs dela. Eram muitos filhos, ao todo talvez uns sete ou oito. Eu e a Dina brincávamos e ela contava-me estas coisas. Todos os filhos morriam de medo do pai, e a mãe também. A Dina cresceu, eu também e naturalmente afastamo-nos. Até que um dia ouvi a mãe dela dizer: a minha Dina arranjou moço, não sei o que vai ser. Claro, a Dina tem uma faltinha e a mãe, melhor do que ninguém sabe disso. A Dina casou-se a mãe disse: não sei se a minha Dina vai dar conta do recado. A Dina teve uma filha que por acaso é da idade do meu filho mais velho e andam juntos na escola desde o primeiro ano. A Dina deu conta do recado. A Dina trabalha numa fábrica, é casada e tem uma filha. É despachada, na boca da mãe: a minha Dina deu mulher de vida, nunca pensei, ela que teve meningite em pequenina. E eu acho que a Dina é feliz, é uma mulher realizada, satisfeita com a sua vida. Sempre que passa por mim a Dina sorri-me e pergunta-me se está tudo bem comigo. Gosto dela. Recentemente o pai da Dina morreu, velho e doente, amado por todos os filhos independentemente de ter sido mau e cruel com todos eles. A Dina veste luto pelo pai, e é sentido aquele luto. Vem-lhe do coração. Esqueceu todas as coças que levou, por amor.

27.9.10

Smoke free

Vou tentar explicar o que sinto ao fim de três semanas sem fumar. Há os dentes que "embranqueceram" um bocadinho e as gengivas que entretanto estão a voltar ao cor-de-rosa original em vez do acastanhado dos últimos anos, e o hálito de merda pela manhã melhorou significativament, já não é de merda, é só o mau hálito normal de quem está a acordar. Depois há uma certa sensação de liberdade porque deixei de pensar nos sítios onde vou condicionada se são espaços fumadores ou não fumadores. Deixei de ter a canseira de ter de ter sempre tabaco comigo e a preocupação de saber onde está o isqueiro. Já não me preocupo se aquele intervalozinho entre afazeres vai dar para fumar um cigarro. A minha sala de estar já não fede e já não há cinzeiros para despejar. Fisicamente ainda não sinto nada de mais, tirando uns ataques de tosse que quando fumava não tinha. Diz que são os pulmões a limpar. Diz que sim. Mas, meus amigos, continuo a ter a mesma vontade de fumar. Pois.

26.9.10

Novo mundo

Se muitas pessoas e acontecimentos nos valem apenas um comentário banal ou um acenar de cabeça inconsciente há outras que nos perturbam de uma forma que nos muda. Se muitas situações são complicadas e confusas há outras que se nos mostram claras como água e o caminho abre-se à nossa frente sem encruzilhadas ou desvios. O verão de 2010 ficará como o verão da mudança, ou melhor, da descoberta. Descobri em mim uma mulher que julgava não existir, descobri que essa mulher pode pouco contra ela própria e no entanto tem perfeita consciência do que faz e de como o faz, e mesmo vendo à sua frente o precipício, resolve dar o passo em frente. Percebi que, mesmo sabendo que o caminho não tinha saída, fui capaz de não travar, fui capaz de avançar, de ir até ao fim. Há agora todo um novo mundo dentro de mim, há toda uma nova percepção da realidade e tudo isto, grande e avassalador é completamente inútil. Nada se pode fazer com tudo isto e aceitei que ficará guardado numa gaveta onde te encerrei. Junto-te agora tudo o que fizeste acordar dentro de mim, junto-te agora tudo o que me fizeste sentir. Guarda nessa gaveta, fecha-a e esconde a chave até que tudo adormeça ou morra, até que as memórias bafientas e cobertas de pó sirvam apenas para serem lembradas, já sem lágrimas e só com sorrisos. Pode ser que um dia, como nos filmes, eu conte esta história e faça alguém sonhar.

23.9.10

Choque em cadeia

Os olhos viram um vulto e um carro que o cérebro não teve a certeza de identificar, mas achou que podia ser um determinado carro e o vulto o seu dono, e isto numa fracção de segundo, em andamento, na estrada. A seguir o cérebro envia instruções e o corpo recebe uma descarga de adrenalina, os braços e as pernas quase perdem a força, as tripas contraem-se e torcem-se e os dentes mordem o lábio inferior. Tudo isto mais ou menos em dois segundos. Restou um nico de frieza para permitir a condução num mínimo de segurança. Fiquei mal-disposta, tinha acabado de almoçar, e tudo isto por causa de um vulto que nem sei se era quem o meu cérebro achou que era, só porque conduzia um carro da mesma marca e da mesma cor. Estou mal-disposta principalmente por saber que não consigo controlar estas reacções que tenho àquele homem. Reajo involuntariamente àquele homem. O meu corpo reage, é incontrolável.

Rostos

Vi há dias uma das raparigas mais populares do meu tempo de liceu. Hoje vi outra. E há ainda outra que rejo frequentemente. Todas muito giras e boas na altura do liceu. Maquilhavam-se e usavam as roupas da moda. Tinham os rapazes todos de volta delas. Eram as maiores. A primeira namorava com um tipo que era lindíssimo mas completamente louco. Dava-lhe ordens e estalos na cara, nem sempre por esta ordem. Ela engravidou e casaram-se. poucos anos depois divorciaram-se porque segundo as más-línguas os estalos evoluíram para grandes cargas de porrada. Quando a vi no sábado passado ia com  filha, uma pré-adolescente, e ela, a mãe, falava nervosamente ao telemóvel. Nervosa, muito nervosa. A que vi hoje era uma miúda engraçada, alegre e gaiteira. Desconheço-lhe o percurso de vida, mas hoje passeava-se nos corredores do super mercado, gorda e feia, arrombada e desleixada, cara fechada e passos lentos. A terceira é caixa nesse mesmo super mercado. Tem a pele cheia de marcas de acne, lembro-me que desde muito nova se maquilhava, tinha quilos de base e pó no rosto diariamente. Era gira e boa, tinha estilo. Não sei se acabou o secundário, mas desde que este super mercado abriu já há uns bons anos que a vejo lá na caixa. A pele estragada e os dentes todos estuporados, não é antipática com os clientes porque não pode mas também não sorri. Vejo estas mulheres e penso que talvez a popularidade na escola e os rapazes todos babados lhes tenham subido à cabeça e espalharam-se ao comprido. Penso nestas mulheres e inevitavelmente penso em mim, que sempre fui uma rapariga roliça, mas alegre. Nunca tive os rapazes em meu redor, mas sempre me dei bem com eles, sempre tive bons amigos, mas eu nunca fui a gaja boa, era a gaja porreiraça. Os anos foram passando e a vida seguiu o seu curso, fui envelhecendo e tive filhos, mas hoje estou bem melhor do que estas três miúdas, gosto mais do meu corpo agora do que quando era adolescente. Mas o que realmente me entristece nestas mulheres é que lhes vejo a infelicidade e a amargura no rosto. As mulheres infelizes são feias, quer se arranjem quer não, podem tentar esconder com roupas caras e maquilhagens magníficas. Podem até ter traços finos, rostos dignos de esculturas gregas ou de telas renascentistas mas a amargura e a tristeza são implacáveis, reconheço-as no rosto de qualquer mulher.

21.9.10

Carne

Como uma lança cravada na carne arranquei-te de mim, a frio, sem hesitar. Como uma lança cravada na carne que ao sair rasga mais um pouco, dói mais um pouco, sangra mais um pouco, para a seguir sarar.

20.9.10

Adeus

Quando um homem te diz que é fácil apaixonar-se por ti, que és uma mulher de trato fácil, extremamente inteligente, bem disposta, que és lindíssima, que ainda por cima não és convencida, quando um homem te diz isto estando deitado na tua cama e principalmente sabendo que é a última vez, sentes-te tentada a acreditar.

19.9.10

Tão errado

Sabes que algo está muito errado contigo quando, já no carro e a caminho de casa, com um sorriso nos lábios e com aquela sensação tão boa que te faz inclinar a cabeça e roçar o rosto no ombro, com o corpo relaxado e mole, a pensar que o P. é uma maravilha e que mais uma vez não te desiludiu, e na rádio toca uma puta duma música e é como se levasses com um balde de água fria pelos cornos abaixo porque sentes que acabaste de trair alguém. Muito errado, mesmo muito errado.

17.9.10

Manda foto

Ri-me tanto que até me deu um ataque de tosse e depois de conseguir compor-me lá respondi que ia pensar porque foi o que me ocorreu responder ao pedido que me fizeram hoje, um pouco antes do almoço, para eu enviar uma foto minha. Nua. Este pedido, não é assim tão ridículo se tivermos em conta que veio de alguém que já me conhece no sentido bíblico há bastante tempo e com quem eu estava hoje, um pouco antes do almoço, a falar para marcar um encontro para amanhã. E porque é que eu tive um ataque de riso de ir às lágrimas e à tosse convulsa? Porque eu, no fundo no fundo, entendi esta merda como um elogio. Cigarros, dai-me cigarros! Depressa!

16.9.10

A doer

Tive sempre a convicção que quando as merdas são a sério, tem de ser a doer, senão não vale. Daí que, o que se sente tem de ser dito, tem de ser escutado. Mesmo que doa ao dizer, e que doa ainda mais depois de ser escutado. Não pode ser de outra maneira, senão fico com a sensação que não é real, e é, por isso rejeito reduzi-lo a uma mera impressão que com o passar do tempo se transforma numa ténue lembrança turva e sem importância, não seria justo. Não seria honesto.

15.9.10

Provas de fogo

Passei ontem à noite com distinção (e ajuda dos amigos porque a dada altura vacilei e pedi uma passa mas não me deram e eu não insisti) uma das provas de fogo para quem está a tentar deixar de fumar: um concerto. Ah pois é. Os Supertramp tocaram ontem no Pavilhão Rosa Mota no Porto. E eu fui. E não fumei. Batam palmas se fazem favor. E gostei muito do concerto e teria gostado muito mais se tivesse fumado um cigarrito, mas pronto, não se pode ter tudo. Quero ver lá para o dia 23 ou 24, como é que vai ser. Preparem os tambores. Vou ovular. Vai ser lindo.

13.9.10

Igual ao litro

Se eu abrisse uma certa gaveta que eu cá sei, e se abrisse um maço que eu cá sei e fumasse um cigarro, ou dois ou três, ninguém saberia. Estou em casa sozinha e seria igualzinho ao litro. Mas não abro e não fumo, porque assim posso dizer que não fumo há 7 dias sem mentir, e mais, com uma pontinha de orgulho. Só me apetece chorar, inexplicavelmente a falta de nicotina dá-me para a lamechice em vez de me dar para ter vontade de partir o focinho a toda a gente, mas, puta que me pariu, hoje não fumo.

11.9.10

Turbilhão



Clã - Sopro do coração

É fodido

É muito fodido quando percebes que o melhor sexo da tua vida não se vai repetir. É fodido quando percebes que aquilo do mover montanhas, do entrar em transe, do já nem saber de que terra és, de já não aguentares mais e o orgasmo vir acalmar o turbilhão em vez de ser o turbilhão não é um mito inventado pelos filmes, que a puta da fasquia não desce dali e não há nada a fazer. É fodido quando percebes que o gajo que te põe a arder com um olhar, que quase que te faz vir só com um sussurro ao ouvido e que te diz meu amor e tu por qualquer motivo incompreensível não te desfazes a rir, é fodido perceber que esse gajo, esse preciso gajo tu não podes ter. Eu já percebi e aceitei isto tudo há muito, mas só deixei de fumar agora, vai daí que as merdas que me irritam, neste momento irritam-me infinitamente mais.

10.9.10

Caminhos

Saio do escritório e entro no carro. Desço a rua e lá em baixo contorno a rotunda. Podia virar logo à direita e subir, depois virar à esquerda e entrar na circular que contorna a cidade e chegaria ao meu destino em 5 minutos. Mas contorno a rotunda e só saio na próxima e vou em direcção ao centro da cidade. O semáforo calha sempre em vermelho, sempre. Espero, gosto de ver as pessoas. Gosto do tempo que perco, não perco porque este tempo não é perdido, gosto de percorrer as ruas do centro, gosto de observar por entre o trânsito lento os avós que trazem os meninos pela mão, as mulheres em passo rápido com os sacos do super-mercado quase a rebentar. Delicio-me com as pessoas que correm para entrar nos autocarros, ansiosas por chegar a casa. Avanço lentamente e ouço a rua. O movimento das pessoas na rua, as compras rápidas antes do jantar, ou o café ou a cerveja descontraída na esplanada. No Inverno é parecido, há sempre gente na rua ao final do dia, há sempre mulheres e homens apressados e há sempre mulheres e homens descontraídos. Há idosos com crianças pela mão. E há trânsito. Às vezes há chuva também. Há, sobretudo vida, várias vidas, muitas vidas que se cruzam diariamente, incognitamente. Não dispenso esta passagem breve pela vida de outras pessoas. Podia contornar tudo isto, mas escolho não o fazer, escolho fazer com que todas estas pessoas que não conheço façam parte da minha vida.

9.9.10

A mim ninguém me cala

Apetece-me tanto fumar! Elas encolhem os ombros e não abrem a boca. Fumava um cigarro agora, ai... Elas entreolham-se e baixam os olhos. Posso dar um grito? Elas escancaram-se a rir. Merda! Ninguém diz nada? Então? Não sabemos o que te dizer, não sabemos se te custa mais se falarmos nisso ou se não dissermos nada. As minhas colegas todas de sala fumam, pois. E eu estou a tentar deixar de fumar. E ajuda-me falar nisso, ajuda-me dizer de vez em quando, quando tenho vontade de fumar, ajuda-me verbalizá-lo. Se, de vez em quando, eu mandar umas bocas, ai que eu fumava uma cigarrada, ai que me apetece tanto fumar, ai que nervos, ai que nojo, foda-se esta merda toda, puta de ideinha esta que me foi dar de deixar de fumar! Pronto, sinto-me melhor. Deixem-me falar!

Nada contra

Ontem fiz o eco-doppler, coincidência das coincidências, o sô dôtor que me fez o exame era o mesmo que me viu no hospital, tanto na urgência em Janeiro como na consulta de Junho. Lembrava-se de mim. Coitado, viu-se fodidinho para me aturar, teve de me explicar tudo, tudo mesmo, o que estava a fazer, o que tinha feito e o que não tinha feito. Como e porquê. Massacrei-o durante mais de uma hora. No fim, fiquei satisfeita, percebi tudo o que me faltava perceber apesar de não concordar com alguns procedimentos. O homem acabou o exame todo contente por ter conseguido limpar a imagem dele e a dizer-me que "até já gosto de si", mas percebeu a argolada e remendou: "Não é que antes não gostasse, percebeu, não percebeu? Não tenho nada contra si". Sosseguei-o: "Claro que percebi doutor, eu também não tenho nada contra si. Nem a favor"

8.9.10

Veredicto

Fiz o tal exame, hoje. O eco-doppler. A veia poplítea está bem. Há lá um pequeno vestígio da trombose na válvula, mas pouco, muito pouco.

Apetece-me tanto fumar. Tanto, mas tanto... Para me distrair ontem à noite fiz chá. Devo ter bebido perto de um litro de chá. Não me apetece chá, hoje. Coca-cola. Hoje é coca-cola.

Tenho de desfazer-me de todas as garrafas de bebidas alcoólicas, antes que a coisa vire...

7.9.10

Noventa

Como na sexta-feira passada já dormiram em casa do pai ontem à noite dormiram comigo, a regra é dormirem comigo só uma vez por semana e normalmente é à sexta-feira. Deitamo-nos como sempre, eu no meio e um de cada lado agarrando-me um braço cada um e uma perna a entrelaçar cada uma das minhas. Mas, o grande começou a queixar-se que tinha qualquer coisa a incomodá-lo numa unha do pé. Acendi a luz e verifiquei do que se tratava. Uma unha partida, nada de especial. Então levantei-me e fui buscar a tesourinha pequenina e agarrei-lhe no dedo para cortar o pedacinho da unha que estava levantado e arranhava o que fosse que tocasse. Acontece que ao agarrar o dedo, não sei como fiz, mas a articulação estalou, e estalou a confusão. Foi um ver se te avias, o grande soltou uma gargalhada quando o dedo estalou, o pequeno achou piada e toca a puxar os dedos dos pés ao grande a ver se estalavam. E o grande, claro, toca a puxar os dedos dos pés ao pequeno. Quanto mais os dedos estalavam mais eles se riam e quando dou conta já me estão os dois a tentar apanhar os dedos dos meus pés e instalou-se definitivamente a tourada em cima da minha cama. Não me aguentei, as gargalhadas eram contagiantes e quanto mais eu me ria menos força tinha para lhes fugir. Não escapou um dedinho, de ninguém, e cada dedo cada gargalhada. Eram trinta dedos naquela cama, eram três pessoas a rir, o que feitas as contas resultou em noventa gargalhadas em menos de cinco minutos. Já tive muitos presentes de aniversário, mas nenhum, nenhum como este.

6.9.10

Hoje

Faço 35 anos.
Deixo de fumar.

5.9.10

Amanhã

Chega a doer um bocadinho. Amanhã é o último dia.

4.9.10

A sangue frio.

Se um dia um dos meus filhos me disser, mãe, aquele homem fez-me isto, ou, aquele homem tocou-me aqui, ou, isso mesmo que ocorre a todas as mães e pais e que é tão medonho que se luta contra essa ideia com todas as forças do ser, se um dia um dos meus filhos me disser mãe, aquele homem, aquele homem, se um dia eu o apanhar, e esforçar-me-ei para o conseguir ainda que seja a última coisa que faça na puta da vida, se um dia eu o apanhar, aquele homem, morre às minhas mãos, às minhas unhas, aos meus dentes. Depois podem fazer um circo mediático à minha volta. Não me importo. Não verterei uma lágrima. Não proferirei uma palavra.

2.9.10

Salva-vidas

Porque projectamos nós nos outros, aquilo que gostaríamos que fossem ao invés de aceitarmos o que realmente são? Tendemos todos para isso, acho eu. Conhecemos as pessoas, até ao nível que nos é dado a conhecer e incluindo sempre o cunho que lhes imprimimos que nunca é isento, faz parte do ser humano, a nossa interpretação tem sempre e só a ver connosco, mas depois projectamos, invariavelmente todo o potencial que a pessoa tem, ou que pensamos que tem. Muitas vezes é esse potencial que é o mais atractivo, diminuímos o real e focamo-nos no potencial. Depois, quando as pessoas não correspondem ao potencial que lhes atribuímos inventamos todos os motivos e mais alguns para que tal não suceda. Há uma pessoa que me acha o máximo. Acha-me linda, maravilhosa e um espectáculo de pessoa. Tudo filme daquela cabeça. Fico chateada, porque não só não me conhece bem como também tem as ideias um bocado baralhadas por conjunturas negativas e então, eu pareço-lhe um raio de sol no meio da escuridão, pareço-lhe o salva-vidas que lhe vai deitar a mão porque se sente a afundar. Tudo filme daquela cabeça. Aceito que me ache bonita, há gostos para tudo e gostos não se discutem. Não aceito que me venere, que me eleve a um plano que só naquela cabeça existe, e muito menos que me tome por salva-vidas. Tomara eu manter a minha vida à tona.

Needs

"I think he always loved me, in his own way, spending no time with me, showing me no affection"

"Why did you stay?"

"I didn't need him to feel about me the same way I felt about him"

1.9.10

As minhas dores

Consegui recuperar alguns hábitos que me fizeram muita falta durante anos. Encontrando-me com tempo para dedicar a mim própria recomecei a fazer aquelas coisas que me dão imenso prazer e das quais me tinha simplesmente esquecido. Recomecei a frequentar as sessões do Cineclube ainda que quinzenalmente, recomecei a deitar o olho aos concertos e às peças de teatro, recomecei a comprar livros. Durante cerca de dez anos li apenas um livro por ano, a minha avidez pela leitura morreu. Li desalmadamente pela adolescência fora, encontrava-me dentro de livros e vivia neles a maior parte do meu tempo, e custava-me imenso deles sair. Li livros que eram para a minha idade e que não eram para a minha idade. Depois casei-me e continuei a ler, tinha muito tempo para mim com um marido que viajava a maior parte do tempo. Depois tive um filho e o tempo para ler fez-se pouco. O tempo para ir ao cinema, concertos e todo o tipo de espectáculos fez-se nenhum. Depois tive outro filho e os dois eram todo o meu tempo, toda a minha vida. À noite, aquele tempo de silêncio de nada rendia, vencida pelo cansaço a leitura era simplesmente impossível, tentava mas de nada servia. Levantá-los, vesti-los, pequeno-almoço, escola ou infantário, trabalho, banho, deitá-los, sozinha porque no meu caso durante a semana não havia com quem repartir as tarefas, tudo isto fazia com que tudo o que lesse fosse inútil. Desisti de ler simplesmente, não valia a pena, não retinha absolutamente nada. As férias grandes, sim, um livro cuidadosamente escolhido, da lista que mentalmente ia fazendo, os que queria ler. Sentia-me reduzida a quase nada por só ser capaz de ler um livro por ano. Sou uma grande parva, não sei organizar-me, não faço a gestão do tempo como devia fazer, deveria conseguir ler mais, não leio mais por exclusiva responsabilidade minha. Nunca culpei fosse o que fosse ou fosse quem fosse pela minha falta de disciplina. Hoje, com tempo para dedicar a todas as coisas que gosto de fazer, com oportunidade de investir no meu prazer pessoal, os livros são o que mais me custa. Não preciso de sair de casa, não preciso de fazer rigorosamente nada, basta pegar neles e abri-los. Não percebo porque me custa tanto. Não percebo porque me doem tanto os livros.

30.8.10

Fútil

O tédio destrói-me, corrói-me, esventra-me. Vazio de tudo, sede de tudo, fome de tudo. E o mais estúpido é que nunca me senti tão bem com o meu corpo, nunca gostei tanto de mim, acho francamente que, fisicamente, estou no meu melhor. Gosto do meu cabelo, das ondas sedosas, gosto da minha pele, macia e brilhante. Gosto das minhas curvas e das minhas carnes, voluptuosoas. Até gosto das minhas mamas, pequenas e mansas. Gosto do meu rosto, das minhas rugas e das minhas sardas que só aparecem no Verão. Não, não é estúpido, é só fútil.

28.8.10

Distância

Observei um casal, não vai há muito, numa festa. Reconheci a mulher. São de cá, apesar da festa ter sido a uns 70 quilómetros daqui, numa praia. Acompanhei um amigo que foi pôr música, numa festa "I love 80's". Este amigo é dj, porque gosta, é de borla e faz disso apenas um hobbie. Pelos menos por aqui, nos meses de Julho e Agosto fecham-se as dicotecas e deslocam-se as festas para as praias. Alugam sítios, ou instalam-se noutros sítios, ou constroem sítios só para as noites de Verão. Este amigo é amigo dos donos dos estaminés nocturnos locais e foi então convidado para essa festa. Levei-o e fui obviamente à festa. No meio de gente muito beta, de casais com mais de 60 anos, de meninas muito bem e de meninos de calça caqui e sapato de vela, reconheci esta mulher, lindíssima, cabelo cor de mel, e olhos azuis, alta e magra, uma elegância. Tem dois filhos, parecidos com a mãe, lindos portanto, já a vi com eles por aqui. Estava com o que deduzi ser o marido, um tipo de aspecto perfeitamente normal. Muito calma esta mulher, enquanto toda a gente dançava como se não houvesse amanhã, ela apenas balançava o corpo, sem sorrir. O marido, mais animado, tentava que ela sucumbisse ao espírito da festa, à musica, tão familiar a música que trazia de volta a adolescência e a inconsciência. Ela, nada. Ele continuava, sorria-lhe, estendia-lhes as mãos, abraçava-a e procurava-lhe o pescoço, ela, nada. Estariam zangados? Hum... Não parecia, não lhe vi raiva nem azedume na expressão, a ela, porque a ele vi-lhe desejo escancarado nos gestos. Entristeci por eles, tão perto, e mesmo assim tão longe um do outro. Uma pena.

26.8.10

Encontros imediatos de terceiro grau

Os meninos foram jantar e dormir a casa do pai. A mãe aproveita a noite livre e resolve ir ao cinema. Até aqui tudo bem. Bom, saí do escritório e programei a noite: compro o bilhete, vou à Fnac procurar o livro e ainda tenho tempo de comer qualquer coisa antes do filme. Fui a um dos centros comerciais cá do sítio e dirigi-me imediatamente à bilheteira do cinema. Continua tudo bem. Com o bilhete comprado, dou meia volta para ir à Fnac e com quem me deparo? Quem? Pois... Outro encontro imediato de terceiro grau com alguém que durante anos e anos tinha desaparecido do mapa e que agora... bem, agora... em poucos dias emerge duas vezes. "Olá tudo bem?" e continuo em direcção à Fnac, resolvo o que lá tenho a resolver e à saída, eis que quase me esbarro novamente com essa pessoa. Ai o caralho... pensei eu, já a achar que isto são coincidências a mais. Já estava sentada à mesa quando me passa, mesmo pela frente, outra vez o gajo. Puta que pariu esta merda, aparece duas vezes em quatro dias, e três vezes na mesma noite.

Fiquei a saber, com estes encontros imediatos de terceiro grau, algo que não gostei nada de ter ficado a saber. Bato com os olhos nele, e estremeço, como dantes. Foda-se,  foda-se,  foda-se.

22.8.10

Autorização para namorar

Sem mais nem menos, assim de rajada fiquei a saber que pelo menos o meu filho mais velho concebe a ideia da mãe ter namorado. Com um de cada lado, pela mão à saída da missa deparo-me com um velho amigo, que do meio de uma confusão de gente aperaltada para o que parecia ser um casamento, se dirige a mim e me cumprimenta. Sorriu aos dois e perguntou o "Tudo bem?" da praxe. Seguimos com o habitual "Adeus, gostei de te ver" e logo o mais velho perguntou "Quem era mãe?" Respondi-lhe que era um velho amigo, do tempo de escola e ele, para minha total surpresa perguntou se era o meu namorado. "Não filho, que tolice!" E ele "Mas, oh mãe, vocês ficavam bem juntos".

(Caiu-me tudo ao chão. Este velho amigo era nem mais nem menos do que o tipo que me tinha ficado atravessado e que recentemente desatravessei. E pensar que passei anos sem me cruzar com ele, agora que já não é preciso aparece-me assim à frente, raio de sorte a minha.)

Mudança

Falta-me apenas decidir sobre as casas de banho, azulejos, louças, torneiras, essas coisas. O resto já está decidido, madeiras, janelas e estores, a nova lareira, a custo de várias visitas a obras e a casas em construção que o senhor é impecável e teve o cuidado de me mostrar o efeito final de cada um dos elementos que tive de escolher. Esperam-me dias e noites a embalar e encaixotar tudo o que tenho dentro de cada armário, todos os livros de todas as estantes. Os móveis serão carregados e depositados num armazém providenciado pelo senhor das obras. A roupa ficará para o final, vai tudo para casa dos meus pais para onde me vou mudar durante os meses que durarão as obras. Lá para o fim do mês de Setembro decidirei sobre a cozinha, falta-me um orçamento. Disseram-me três meses, conto com cinco. Viverei portanto uns bons meses em casa dos meus pais, e nesse tempo há o regresso às aulas, tanto dos miúdos como o meu, há a tentativa de deixar de fumar que prometi à minha mãe e a mim própria, há o regresso ao exercício físico. Será uma excelente oportunidade de me livrar de alguns péssimos hábitos que tenho.

21.8.10

Bouillabaisse

Em 2004 tive de ir a St Tropez trabalhar. É verdade, trabalhar, estranho não é? Mas o cliente em questão, depois de ter apresentado a colecção aos representantes europeus cá em Portugal e cá na terrinha, foi de férias para St. Tropez de mandou-nos lá ir ter com ele passado mais ou menos um mês para nos passar as encomendas. tratava-se de uma marca americana, e como as encomendas para a Europa já tínhamos, um mês depois teríamos as encomendas para os Estados Unidos. Preparámos os modelos todos e lá fomos, eu e a minha colega, de malas e sacos aviados para St. Tropez. Julho, calor filha da puta e o bikini devidamente guardado dentro da mala, obviamente. Se despacharmos o trabalho rapidamente ainda damos uns mergulhitos, pensamos nós. Pois muito bem, trabalhamos como umas burras, aturamos malucos de meia-noite mas tivemos uma tarde de domingo livre. Um dos comerciais de uma das fábricas que tinham trabalhado na colecção e que tinha as consequentes encomendas, foi lá ter connosco porque queria a informação que lhe tocava logo que possível e regressaria mais cedo do que nós. Almoçámos nesse dia no hotel onde estávamos todos hospedados. Todos porque além de mim e da minha colega, estava o nosso patrão, o nosso agente nos Estados Unidos, o tal comercial, o representante francês, a mulher, os filhos e a bábá, o dono da marca, a mulher os filhos e a bábá, e mais dois ou três capangas do dono da marca que além de lhe chegarem os cigarros, de lhe carregarem os sacos e de lhe tratarem das mais variadas merdas, também lhe organizavam as saídas e garantiam entrada em qualquer discoteca e/ou restaurante em St. Tropez. Um verdadeiro circo. Dizia eu, almoçamos nesse dia no hotel, no terraço ao lado da piscina e a estrela (o dono da marca) lembrou-se de mandar fazer uma Boullabaisse para o jantar (prato típico do sul de França, creio que é mesmo típico de Marselha, mas não tenho a certeza, é parecido com uma caldeirada de peixe) e perguntou aos convivas quem alinhava. Encomendou-se a Bouillabaisse então para o jantar. Tarde de sorna na piscina, tudo a jibóiar ao sol, nós as duas entretidas na conversa com o nosso colega português e com a mulher da estrela, muito simpática por sinal. A meio da tarde entram uns 4 ou 5 gajos munidos de guitarras e desatam a cantar espanholadas tipo Gipsy Kings lá ao pé do povo. Fartaram-se de cantar, já ninguém os podia ouvir, um desespero para todos os presentes menos para a estrela, é fã do género, ficamos a saber. No fim, a estrela aplaude entusiasticamente, faz sinal ao outros todos para aplaudirem também e grita: Très bien, on prend les gitans pour le dinner!!! Nós as duas deitamos as mãosinhas à cabeça, o nosso colega revira os olhos e diz: Creeeeeedo! Pensei que íamos comer peixe...

19.8.10

Dores de crescimento

Lembro-me bem quando me deitava e me doía a dobra das pernas, por detrás dos joelhos e não havia posição que acalmasse o raio da dor. A minha mãe dizia-me que eram as dores de crescimento, que era normal. Sei lá se eram, mas doía e não era pouco. Há outras dores, na idade adulta, daquelas que o corpo não sente e essas são sim, as dores de crescimento. E doem muito mais. Doem cá dentro, por dentro, e não há pomada, comprimido ou xarope que as acalme. O único calmante para estas dores é o perceber que não somos os únicos com dores, que há outros como nós e que há sempre quem não nos julgue. Há sempre alguém que nos segure a mão, que nos dê a opinião sem censura que mesmo não sendo igual à nossa nos faz pensar e nos ajuda a aceitar as nossas falhas como parte de nós, e a retirar-lhes a lição para evoluirmos como indivíduos. E quando finalmente percebemos e aceitamos que a vida não é a preto e branco mas pintada de milhares de tons de cinza encontramos alguma paz. Quando finalmente aceitamos a nossa condição de seres feitos de racionalidade mas também de impulsos, que não deixamos de ser bichos muitas vezes guiados por instinto, estamos a crescer.

18.8.10

Guerra

Ontem à noite o pequeno quis dormir em casa dos avós, então fui para casa com o grande e decidimos ver um filme que tinha acabado de começar. Vimos o Tróia, eu pela quarta ou quinta vez, que eu gosto de épicos e de filmes onde há guerras, sangue e honra, e ele pela primeira. Deliciei-me a vê-lo ver o filme. Gostou das batalhas e das espadas, dos guerreiros e das armaduras, dos navios e dos cavalos, mas lindo foi vê-lo a absorver o discurso dos reis e a ler a raiva e a ganância, o discurso dos amantes e a descobrir o adultério, o discurso de Heitor e a interiorizar o carácter, o discurso de Príamo e a perceber o amor. O meu filho percebeu aquilo tudo, percebeu as metáforas todas. Mas não percebeu uma coisa fundamental porque no fim disse-me que o filme foi justo. Foi justo? Sim mãe, o Páris matou o Aquiles porque ele matou o Heitor, que matou o Pátroclo pensando que ele era o Aquiles, e que também também matou Menelau para defender o Páris. Continuou: e o Menelau queria matar o Páris porque ele lhe roubou a mulher, e foi por isso que começou a guerra mas eu sei que o Agamémnon aproveitou a guerra porque queria conquistar Tróia. A guerra foi justa. Na cabeça dele aquilo teve lógica, mas que desgosto! Meu amor, a guerra não foi justa. Meia dúzia de homens decidem a guerra e muitos inocentes morrem, não viste? Não viste quantos soldados morreram? Não viste quantos troianos morreram sem culpa de nada? Sim, tens razão mãe, devem ter morrido milhares de pessoas naquela guerra não é? Pois. Vês? Nenhuma guerra é justa meu amor, nenhuma.

(Também gostei da parte em que o Aquiles salta para a espinha da refém e ele me pergunta: estão a fazer amor, pois estão mãe? Ui... sem preservativo... mas naquela altura não havia preservativos, pois não mãe? Pois não...filho. E no final quando Aquiles vai desvairado à procura da miúda, ele diz: está à procura da mulher dele, não é mãe? Podemos dizer que é a mulher dele, pois podemos mãe? Eles gostam um do outro mãe...)

17.8.10

Silêncio

O que não se diz é tão importante como o que se diz.
Assim como aquilo que não se faz é tão revelador como o que se faz.
Às vezes, até mais.
Que ninguém se iluda.

15.8.10

Julião Sarmento

No Tate Modern Museum, em Londres, numa sala só com obras dele. Houve uma que não irei mais esquecer. A acompanhar uma sequência de fotografias de um torso de uma mulher, tem o seguinte texto:

"Des le commencement il y a ton ombre qui leche mon corps, et des que mon corps se laisse lecher par ton ombre, mon corps se fait en brume."

Pode ser vista aqui.

(desde o início há a tua sombra que lambe o meu corpo, e desde que o meu corpo se deixa lamber pela tua sombra, o meu corpo faz-se em bruma)

13.8.10

O amor

Há um homem que se casou com uma mulher, que não ama que nunca amou e de quem fez a segunda escolha, mas nunca a traiu. Ama desde sempre outra mulher que não consegue esquecer, apesar de nunca lhe ter tocado. Vive assim, resignado. A mulher dele sente-lhe o mau humor, sente-lhe a indiferença e a distância. Vive assim, resignada.

Há um homem que se casou com uma mulher, que ama profundamente, a quem dá toda a atenção quando estão juntos. Leva-a ao cinema e ao teatro, ajuda-a em tudo o que pode, esforça-se por ser o melhor marido, e trata-a muito bem. No entanto, no horário de expediente, porque pode, trai-a sempre que tem oportunidade, tem casos fugazes com variadíssimas mulheres e não consegue viver sem isso, sem a emoção da caça, sem a adrenalina. Vive assim, no limite. A mulher sente-lhe o carinho, o amor, a dedicação. Vive assim, sente-se a mulher mais amada do mundo.

Há um homem que se casou com uma mulher, diz-lhe que a ama todos os dias e nunca a traiu. Pensa basicamente nele, e não nela. Faz o que quer e não tem em conta os desejos dela. Diminui-a todos os dias, emocionalmente e intelectualmente. Diz-lhe que a ama todos os dias. Desilude-a frequentemente com comportamentos que a magoam sem sequer se dar conta disso. Desvaloriza os sentimentos dela, o amor dela. Vive assim, sem noção do que lhe faz. Ela sente-lhe a arrogância, sente-lhe a distância, sente o quanto ele se acha melhor do que ela, e sente que só está com ele porque a ele lhe convém. Vive assim, frustrada.

Conheço estes três casos de perto, e desconheço se o homem comprometido de quem falei se encaixa em algum deles, nunca saberei.

Pergunto a todas as mulheres qual destas três esposas preferiria ser.

O que conta mais? O que eles efectivamente fazem ou o que eles nos fazem sentir?

Eu já fui a terceira e não gostei, por isso, já não sou.

1.8.10

London

Here I go.

Plástico

Sempre que vou a Trás-os-Montes venho de lá com a sensação que a minha vida é de plástico. Descartável. O ambiente agreste lá de cima faz-me sempre pensar que não dou o devido valor às coisas. Caio sempre num estado de espírito que me atinge como um balde de água fria. Volto sempre a achar que ali sim, se vive verdadeiramente. Ali, nas aldeias de Trás-os-montes, onde se trabalha a terra, onde as estações do ano comandam o ritmo da vida, onde tudo é díficil e vem apenas do trabalho, ali é que se vive. Aqui, onde tudo é fácil, onde tudo se compra feito, onde tudo se desperdiça, aqui a vida é de plástico, não conta. Nem se trata de ter mais ou menos dinheiro, de ter mais ou menos poder de compra, é o trabalho, é o levantar de madrugada, é o frio, é o ter a canseira de fazer as coisas mesmo que custe, senão não há frutos, senão não se come, senão não há nada. Não sei explicar porquê mas no fundo, tenho a convicção que aquelas vidas difíceis valem muito mais do que a minha.

19.7.10

Prashand Gupta

Conheci um senhor indiano que é fantástico. Riquíssimo, fornecedor de tecidos de várias fábricas no Bangladesh com as quais trabalhei. Pensava comprar um avião a jacto daqueles pequeninos no ano seguinte. Por esta altura já o deve ter. E este homem está absolutamente convencido que o sucesso dele se deve maioritariamente, além da sua competência para o negócio, a umas determinadas regras que aqui vou revelar. Foram-me reveladas a mim e à minha colega e amiga que me acompanhou nessa viagem, numa noite muito mística. Eu não sou nada dessas coisas, não alinho nessas ideias místicas e cenas do género, custa-me, pronto. Mas tomei nota dos ensinamentos de Mr. Prashand e nunca fiz nada do que ele nos ensinou. Segundo ele, se formos rigorosos, só nos acontecem coisas boas. Portanto, quem quiser experimentar, faça favor:

As regras das cores para a roupa:
Segunda-feira – branco
Terça-feira – vermelho / tons de coral
Quarta-feira – verde
Quinta-feira – amarelo
Sexta-feira – branco / cores claras
Sábado – azul royal / azul marinho / preto
Domingo – vermelho / tons de laranja

- Nunca usar azul (qualquer azul, mesmo marinho) ou preto ao Domingo.

Claro que não é necessário que se vistam estas cores integralmente, pode ser uma peça apenas, excepto ao Domingo que estão proibidas as cores acima mencionadas.

Deixo também a regra de ouro do Sr. Prashand: (e vai em inglês)

Never abuse
Never lie
Never swear

Só digo que quanto às cores para cada dia da semana, dou cabo da lógica toda da coisa porque há simplesmente cores que não uso e ao Domingo uso frequentemente preto.

Quanto à regra de ouro, só a primeira parte é que talvez conseguisse fazer, porque a parte do mentir e praguejar, ui, é um descalabro. Minto com quantos dentes tenho no trabalho, aliás é uma arte que desenvolvi com todos os requintes, no ramo em que trabalho é fundamental. E o praguejar, bom, lamento mas não é só no trabalho. Se o Sr. Prachand soubesse dava-lhe uma coisinha.

The big chill



Um dos melhores filmes que vi.

15.7.10

Look

Novo look.
Vai custar-me, mas já que se muda querendo ou sem querer, premeditadamente ou de surpresa, muda-se também o visual do blogue, porque não?

Outra coisa boa nesta merda toda

são as reacções dos meus amigos.

Uma amiga olha para mim e diz:

"É bem feita! Tens a puta da mania que nada te afecta e olha para ti, com este até tremes toda cagadinha de medo, puta de figura a tua. É bem feita!" E eu aceno com a cabeça, que sim, e rimo-nos às gargalhadas.

Outra, corrosiva, diz:

"Achas que ele vai disistir assim? És mesmo crente. Não tarda nada o gajo aparece-te aqui à porta do escritório e nem vais saber de que terra és, é que vou gostar!" E eu aceno com a cabeça, que sim, e rimo-nos às gargalhadas.

Um amigo, diverte-se e diz:

"Foda-se, ainda não marcaste um encontro com o gajo? Estás à espera de quê caralho? Vai lá e come o gajo, que te sai a puta da cisma. Ui, quando ele te puser a pata em cima e te disser: vamos foder, tu até desmaias." E eu aceno com a cabeça, que sim, e rimo-nos às gargalhadas.

Apesar de tudo, tenho-me rido bastante nestes últimos dias, às gargalhadas! Uma galhofa.

14.7.10

Novidade

Nunca me encontrei numa situação destas, em que não tenho domínio. Estou a aprender. É tudo novo e vai tudo contra aquilo em que sempre acreditei. A imagem da mulher que eu achava que era está para sempre alterada. Esta mulher que reage assim não é a mulher que eu pensava que era. Esta mulher é fraca. E vaidosa. Deixou-se levar pela ideia que tinha de si própria e depois percebeu que fez merda. Foi como quem leva um estalo. Esta mulher que sou eu, mesmo que use a terceira pessoa não deixo de ser eu, mesmo que esteja a olhar para mim como se fosse outra, esta mulher que sou eu, vai aprender que não é nenhuma fortaleza, que não é a maior da rua dela. Já sei que a coisa agora acalmou, já sei, mas esta merda ainda vai dar pano para mangas, já sei que o gajo vai voltar à carga, que não lhe vou resistir, que vou acabar na cama com ele e que me vou sentir uma merda a seguir, que me vou arrepender, ou seja, vou bater com as putas das costelas no chão. Não sei porque tento enganar-me.

13.7.10

Grande parva

Passei o dia agoniada como pensava que já não pudesse ficar. Ontem meti a pata na poça e hoje o medo atormentou-me até aos ossos. Fiz tudo ao contrário do que tinha prometido a mim própria fazer, que não ia responder a qualquer contacto. Pois, mas não. Eu sabia que um dia este gajo ia aparecer-me à frente, mas perturbou-me muito mais do que eu pensava. Ontem falei mais do que devia, talvez na tentativa de obter respostas a perguntas que sempre me fiz e mais valia ter estado quieta. Ele veio. Veio rondar, veio ver, veio tentar. Armei-me em esperta e fiz de conta que era forte. Estendi-lhe a corda e ele agarrou-a com unhas e dentes. Depois fiquei cagada de medo. Não sei como mas consegui erguer um muro. Aceitou. Só que é apenas uma questão de tempo, sei-o. Mas sei que não vou conseguir defender-me quando ele resolver saltar o muro, e agora ele também sabe.

Felino

Sentiu-se nas garras de uma pantera que, elegante e segura, a encurralou. Sentiu-se impotente perante uma fera que ela não queria domar. Sentiu-se perdida naqueles braços que a apertavam ao limite da dor. Sentiu-se uma presa que percebendo-se irremediavelmente apanhada, viu nos olhos do predador que a única fuga possível seria abandonar-se ao seu destino. E a pantera, confiante, tomou a sua presa. A presa fechou os olhos e deliciou-se.

12.7.10

Alta

Tenho a informar que o raio do regime funciona! Hoje de manhã a balança marcou menos dois quilos! Só me resta render-me às evidências, comer hidratos de carbono em quantidades industriais faz perder peso. É verdade que há pequenos detalhes que temos de eliminar como molhos, álcool e açúcar, mas podemos comer compotas e manteiga no pão, carne e peixe em quantidade razoável, e empanturrarmo-nos de arroz, massa e batatas. Não é nada mau. De modos que hoje estou em alta, um fim-de-semana excelente a todos os níveis e a cereja no topo do bolo: estou mais magra. Categoria!

11.7.10

A partir do momento

em que aceitas os outros como são e não esperas deles aquilo que eles não são capazes de te dar, consegues ajustar a tua vida e a tua postura perante eles de acordo com isso, a partir daí, vives muito mais feliz.

9.7.10

Wake up

Tudo calmo, tudo em ordem. A vida rola sem pressa, sem sobressaltos, enfim. E de repente há uma pedrada no charco, algo que faz com que, nasça uma pontinha de agitação. Daquelas coisas que caem assim no nosso colo e que nos fazem pensar que afinal, quando menos se espera contecem coisas boas e nós nem fizemos nada, basta existirmos. Hoje de manhã, quando acordei e vi as horas no telemóvel reparei que tinha uma mensagem. Quando a li, fez-me precisamente este efeito, senti-me bem. Primeiro porque foi uma completa  surpresa, segundo porque o remetente da mesma demonstrou possuir uma característica que me agrada muito, pode até estar cagadinho de medo, mas faz-se à vida. Adoro.

8.7.10

No tempo

em que a existência se reduzia a muito pouco, no tempo em que o coração quase não batia, em que o cansaço era soberano, no tempo em que a dor no peito era tão forte que respirar se tornava impossível, no tempo em que chorar seria um bálsamo, no tempo em que o sono era uma miragem, nesse tempo, eu ouvia isto, ouvia desesperadamente, como quem se agarra aos destroços de uma vida naufragada, para não afundar.

Despistada

Tive de dar uma série de voltas agora à hora de almoço. Várias coisas para tratar na rua, mas percursos que obrigam a andar de carro. Um calor infernal. Entra no carro, sai do carro, tudo normal. Até que chego ao sítio onde fui levantar o Cartão de Cidadão e mal sai o bilhete da maquineta com o número, o ecrã solta imediatamente aquele toque e aparece o meu número atribuido a um balcão que estava vazio. Hesitei, verifiquei o ecrã e batia certo, era mesmo aquele balcão. Fui e vem lá de não sei onde um senhor na minha direcção, quer dizer, na direcção do balcão e muito delicadamente mandou-me sentar. Muito simpático, gostei. Depois tive de passar em casa porque me esqueci de uns documentos e como queria carregar o telemóvel no multibanco mesmo por baixo não meti o carro na garagem e estacionei-o em frente ao prédio. Vou à caixa multibanco e um senhor que lá estava cedeu-me a vez, muito gentil, agradeci e tratei da minha vida e o homem lá ficou à espera. No regresso ao escritório, parei no sítio do costume, onde tomo todos os dias o pequeno-almoço, para comprar qualquer coisa para comer, e enquanto esperava que me servissem, reparei num jovem que sentado numa das mesas mais próximas me mirava de cima abaixo. Estranhei, pensei logo que grande merda devo ter a roupa suja ou qualquer coisa, e aí fez-se-me luz. Roupa... pois... raio de ideinha me deu hoje para vestir os putos calções e ainda por cima com o top que nunca deve ser conjugado com outra peça de dimensões reduzidas, mas hoje de manhã não me ocorreu e enfiei os calções e o top e aqui a gaja andou a fazer estas figuras, a mostrar demasiada carne e tão tótó que sou nem achei estranha tanta simpatia. Moral da história: dou-me mal com o calor.

7.7.10

Eficácia

O habitual é ser o grande a vir a chorar contra o pequeno. O grande é sossegado, o pequeno é atravessado. Normalmente o pequeno bate no grande, provoca-o e massacra-o. Mas às vezes, lá vem o pequeno a chorar contra o grande porque o grande, já pelos cabelos, lhe mandou um safanão que o fez, literalmente, voar. Confesso que tenho medo e ralho sempre, ao pequeno para não dar cabo da cabeça ao grande e ao grande para não magoar seriamente o pequeno. Ontem à noite, estavamos em casa dos meus pais, os grandes ainda sentados à mesa nas traseiras calmamente a tomar café, e os pequenos já na sala a ver televisão no sofá. As portas estavam todas abertas e ouvimos começar a discussão à conta do espaço ocupado por cada um no sofá. Eu olhei para os meus pais e para o meu irmão com a cara de "oh não, vai começar" e eles encolheram os ombros com a cara "vai lá impôr respeito antes que a coisa descambe". Mas, subitamente a discussão acabou, fez-se silêncio e vem o pequeno a chorar, braço estendido, o indicador a apontar em direcção à sala e ao sofá, e grita: "oh mãaaaaaaae, ele deu um peido para cima de mim!!!"

Explodimos todos a rir. Eu sei que devia ter ralhado, eles não costumam usar estas linguagens, mas juro que não consegui.

6.7.10

Quando o melhor momento do dia é à noite

Venho de lá de dentro, da zona dos quartos, como sempre faço, depois de os deitar e sento-me no sofá e acendo um cigarro. Deito-me com o mais novo e leio-lhe uma história que ele escolhe. Encanto-me sempre ao ouvi-lo ler o título, estamos a ler as fábulas de La Fontaine. Leio-lhe, apesar dele já ser capaz de ler, o primeiro ano está feito. No fim, apago a luz e ele abraça-me e dá-me muitos beijos, e não adormece sem estar encostado a mim, tem de me tocar, tem de me sentir e adormece em menos de 2 minutos. Então levanto-me e saio de mansinho em direcção ao quarto do mais velho, que está a ler a sua enciclopédia, que pode ser do corpo humano, pode ser de animais ou então de meios de transporte ou grandes construções. Hoje era sobre combóios. Quando me vê chegar fecha o livro e apaga a luz, deito-me ao lado dele e repete-se o ritual do beijo. Só um, este não é beijoqueiro, e vira-se de costas para mim pegando-me na mão e colocando-a à volta da sua cintura enquanto os pés procuram os meus. Gosta de me sentir os pés, nisso é como eu, pés com pés, também gosto. Demora mais tempo a adormecer do que o irmão, conversa sempre um bocadinho comigo no escuro em voz baixa. Fala-me do que esteve a ler em jeito de professor, e eu aprendo, e às vezes conta-me pedaços do seu dia. Depois adormece sossegado. Por muito mau que tenha sido o meu dia, por muito mal que eles se tenham portado, por muito irritada que esteja, recuso-me a que o momento deles adormecerem, aquele momento tão solitário às vezes, onde o silêncio impera dando todo o espaço aos pensamentos, não seja carregadinho de amor.

5.7.10

Parir

Não é à toa que foi destinada às fêmeas a tarefa de carregar a cria no ventre e de a parir no fim do tempo. É que a Natureza sempre soube que uma fêmea, por muito que lhe doa, por muito que lhe custe, ainda que lhe rasgue as entranhas, a fêmea faz o que tem de ser feito, e a cria vem ao mundo. Há milhares, ou milhões de anos que é assim. Porque se esta tarefa fosse confiada aos machos, na hora da verdade, fechavam as pernas e ficavam à espera que passasse. É preciso fazer? Uma mulher faz. É fodido? Uma mulher faz. Custa cumó caralho? Uma mulher faz. Onde é que ela vai buscar a força? Pois ela não sabe, mas faz. E quando uma mulher tem de parir seja lá o que for, ela sabe que é para ela, ela sabe que ninguém o vai fazer por ela. Os homens, ao invés, esperam que passe. Os homens, por norma, não fazem. Em raras excepções eles podem até fazer, mas o truque é nunca esperar deles que façam. Fica tudo muito mais simples.

3.7.10

Convencida

Não é totalmente verdade mas também não é totalmente mentira.



Compra-venda-troca

Da primeira vez o meu irmão foi comigo, mas hoje tenho de ir sozinha. Vou ao stand ver um carro. Tenho de trocar a minha traineira e quero ver vários, não só porque o orçamento não é ilimitado, longe disso, como também quero alargar o leque de opções e tentar fazer a melhor escolha possível. Numa situação ideal onde não teria de preocupar-me com os numeros a escrever no papelito na hora do pagamento saberia muito bem onde ir e o que trazer para casa, contudo isso é mesmo só aquela coisa do se fosse acima e se fosse abaixo e como não há cá se fosses nenhuns e só há o que é mesmo, o que é mesmo é que os euros que há são os euros que há e ninguém me vai dar mais e são os que eu posso trocar por um carro, junto com a minha traineira que não vale quase nada, mas que há-de servir para alguma coisa. Nestes momentos rogo na pele do meu ex-marido que no final de 2003 achou que não valia a pena comprar um motor a gasóleo, e vai e compra-se uma carrinha com um motor 1.8 a gasolina, que além de beber como uma louca, agora não vale a ponta de um chavelho. E eu que me lixe agora, que sou eu que tenho de a vender. Ora merda!

2.7.10

Control freak

Pois é, control freak. Só que eu eu não pretendo controlar tudo, só a mim. É algo estranho eu ter esta mania e no entanto não ser obcecada por ter tudo planeado na minha vida. Gosto de não ter tudo sempre planeado e ir andando ao sabor do que me apetece, mas isto claro é só no que a mim diz respeito, porque no que diz respeito aos meus filhos obviamente que penso nas coisas com antecedência e planeio o que tem de ser planeado. No entanto tenho um profundo pavor a perder o controlo, por causa disso nunca na vida me embebedei a sério, páro de beber logo que começo a sentir-me tonta. Por isso nunca expludo, por isso é raríssimo seguir impulsos sem antes os tentar compreender. E se momentos há em que acho que esta minha capacidade é uma grande coisa, muito útil e que me evita de certeza muitas chatices, tenho outros em que me pergunto seriamente até que ponto não estarei a transformar-me numa pessoa completamente calculista e manipuladora, daquelas que eu não gosto. E isto leva-me ao início, a minha mania de me controlar e de ter sempre a noção das coisas, e reparo que não me dando conta, provavelmente estou a ir precisamento pelo caminho que abomino e sem ter sequer consciência disso. É ruim...

30.6.10

Nervos

Estou cheia de trabalho, estou exausta, tenho saudades dos meus filhos, e tenho milhares de coisas a rabiar dentro da cabeça como a remodelação da casa, a troca de carro, as matrículas, as incrições, as papeladas, as compras que preciso de fazer, as arrumações que urgem, e o filha da puta do tempo que não estica, e estas merdas todas não se fazem sozinhas. Há alturas em que sinto que a minha vida se equilibra a muito custo em cima de umas canas finas e que aos tropeções no piso sinuoso a qualquer segundo pode desabar. E enervo-me.

28.6.10

As pessoas são engraçadas

Esta é mais uma das coisas que não percebo. A minha mulher a dias, que desde a separação divido com o meu ex-marido, vem frequentemente falar-me de coisas, de merdas, de situações que se passam em casa dele. A maior parte das vezes nem a ouço e as que ouço esqueço quase de imediato. Já lhe expliquei que não me interessa rigorosamente nada do que lá se passa e que não quero que ela me fale disso. Contudo a senhora, apesar de ser uma excelente pessoa e uma boa profissional não prima pela inteligência nem pela esperteza e a cada passo lá vem com as conversas às quais só obtem da minha parte uns pois, uns deixe lá isso, uns não quero saber e outras coisas deste género. Parto obviamente do princípio que o mais certo é que faça o mesmo no sentido inverso, coisa que não chateia absolutamente nada, e dou-lhe o devido desconto. Há contudo outras pessoas que me espantam com as coisas que me dizem. Encontrei numa loja um casal que foi meu vizinho, quando nos primeiros anos de casada vivi onde vive agora o meu ex-marido. Não os via há anos, desde que nos mudámos para outra casa, e depois dos cumprimentos da praxe, a senhora lá vem com a conversa do pois, quem lá vive outra vez é o seu ex-marido, e eu sim, regressou, e ela é verdade, mas deixe lá, há coisas piores do que um divórcio, e eu exactamente, são coisas que acontecem, e ela mas olhe, ele também não acerta com nenhuma, já por lá têm andado várias e não acerta com nenhuma. Apeteceu-me insultá-la mas contive-me num simples, isso não sei nem me interessa. Despedi-me e virei-lhe costas. O que é isto? Qual é a necessidade desta senhora de me dizer este tipo de coisas? Não lhe perguntei rigorosamente nada, no entanto automaticamente fez comentários relativos à vida amorosa do meu ex-marido. Tem a certeza que é um assunto que me interessa, e deve ter ficado desiludida por eu não ter querido saber mais detalhes. A verdade é que eu sei perfeitamente que ele já tem namorada completamente assumida perante os filhos e perante os pais e que a namorada até já tem ficado a passar fins-de-semana em casa dele com os miúdos mas não abri a puta da boca. Primeiro ao fazê-lo seria exactamente igual a esta senhora ao permitir-se fazer comentários sobre um assunto que não lhe diz respeito, segundo porque correria sérios riscos de ser mal interpretada, estou mesmo a imaginar a senhora a ficar convencida que eu estou chateadíssima com o facto do meu ex-marido ter arranjado namorada. Estou-me completamente nas tintas para isso, quer dizer, não estou nada, a verdade é que acho muito bem que ele tenha assumido a namorada e estou satisfeitíssima porque os miúdos gostam imenso dela. O que eles me contam, com a maior naturalidade do mundo e sem eu lhes perguntar nada, a respeito da namorada do pai é muito positivo, que mais poderia eu querer? Nada. Por mim, está óptimo.

27.6.10

Aflição

Ontem fui para a praia com o P. Vi-me aflita. Ele não pára quieto. Vi-me aflita. Parecia possesso, e eu já a ver-me perdidinha. Aquilo não podia ser, resolvi que vinhamos embora, e quando cheguei a casa foi um fogo-de-artifício que mais parecia a noite de S. João, com a ligeira diferença que não era de noite, nem foi de artifício. 

Parece impossível

Hora de almoço. à chegada a casa dos meus pais com os miúdos, que dormiram em casa do pai na noite anterior:

Mãe: Olha lá, sentiste o cheiro do pequeno?
Eu: Senti, é o perfume do pai, e que tem? Deve ter pedido ao pai para lhe pôr perfume, ele gosta.
Mãe: E não te importas?
Eu: Porque haveria de importar-me?
Mãe: Não tens saudades daquele cheiro?
Eu: (meti a expressão "tás maluquinha ou quê?") Não.
Mãe: Vá, diz lá, nem só um bocadinho?
Eu: Nada mamã, nadinha, ze-ro!!!
Ela: (meteu a expressão "tu não deves bater bem") Parece impossível...

24.6.10

Dona da casa

Se eu quiser sei ser a perfeita dona de casa. Se eu quiser. Mas não sou, ao invés sou a dona da casa. Sou tudo o que a dona de casa é e sou a dona, sou eu que mando, sou eu que decido, sem prestar contas ou ter de negociar com ninguém. Isto é bom. E por conta disto, meti-me numa aventura que é remodelar a minha casa. Adiei durante meses, faltava-me a energia. Finalmente meti mãos à obra e chamei o homem que vai tratar de tudo. Já cá vieram com ele um carpinteiro, um electricista e um outro que não sei como lhe chamar mas vai tratar das janelas. Estou à espera do orçamento e não aguento de curiosidade. Estou em pulgas e nem o facto de ter de tirar tudo cá de dentro, mudar-me para casa dos meus pais durante uns meses e depois ter de voltar a pôr tudo no sítio me fazem esmorecer o entusiasmo. Engraçado como bastou apenas uma chamada e uma reunião com o homem para que haja outra vez entusiasmo dentro de mim. Isto é bom.

23.6.10

Fácil

Faz-me sempre imensa confusão ouvir falar de paixões. Ai que estou tão apaixonada(o), ai que nem sei o que fazer, ai que estou doida(o) por ele(a). Isto faz-me confusão. Ontem à noite, numa das séries que gosto de ver percebi que aquela gente já estava toda apaixonada por outras pessoas, bastou-me falhar dois episódios para que ficasse tudo trocado. Já não estão apaixonados por quem estavam e por quem sofriam horrores e agora já se encontram apaixonados por outros. Que coisa, será assim tão fácil apaixonarem-se? Fiquei desiludida, de repente a série que gosto tanto passou a ser de ficção. Não gostei, mesmo sabendo que tudo na TV é ficção, eu gosto da ficção que pode muito bem ser verdade. O povo apaixona-se e desapaixona-se assim tão facilmente? Como se fosse um simples carregar de botão, como se fosse automático, e como se fosse completamente independente da vontade de cada um. E isto, venha quem vier, não me cabe na cabeça. lamento muito. Não é assim fácil, nem apaixonar-se, nem desapaixonar-se. Não é. E sobretudo não é instantâneo, não se acorda um dia e se constata que se está apaixonado, não se olha para uma pessoa e se percebe que se está apanhado. É infinitamente mais complicado do que isso, acho até que o mais difícil é admiti-lo perante nós próprios. Se eu nunca pensar que estou apaixonada, nunca estarei. Posso até achar piada, posso muito bem sentir desejo, posso até sentir a falta, mas se estas palavras nunca forem proferidas ou pensadas, esse estado jamais se materializará. E há milhares de motivos pelos quais essas palavras fiquem de fora do léxico comum. Há milhares de formas de as repelir. Há milhares de maneiras de as evitar. E também há uma razão que invalida tudo isto que acabo de escrever. O medo. Não, não estou apaixonada e não tenho medo de me apaixonar, mas também não o anseio. É como conduzir a alta velocidade, é óptimo não há dúvidas, e apesar de já ter acelarado bastante e ter sentido toda a adrenalina daí resultante, vivo bem conduzindo no limite imposto por lei.

Peso

Pesei-me esta manhã, uma semana após o início do regime alimentar que contraria toda a lógica. Tenho comido imenso, de tudo o que habitualmente automaticamente me faz rebentar as costuras da roupa, verifiquei que a balança marcou o mesmo número de há oito dias atrás. Inacreditável, não engordei!!!

22.6.10

Está bem

E pronto, posso finalmente parar de tomar o anti-coagulante e deixar de fazer as visitas bi-mensais ao Hospital para verificar o meu sangue. Ao fim de seis meses os senhores doutores vão analisar o dito, não sem deixar passar um mês sem interferência de medicação, para averiguar se há uma tendência genética para as tromboses. Iremos saber então porque raio tive eu uma Trombose Venosa Profunda, se de resto sou uma mulher perfeitamente saudável. A única coisa que me causa espécie é que não fui submetida a qualquer exame, ninguém sabe se o coágulo continua na veia ou se foi naturalmente absorvido. Mas acho que se o trombo ainda lá estiver, o sangue livre de anti-coagulante engrossará e voltará a ter dificuldade em circular e voltará causar dor. Está bem, poupa-se o custo do exame e se a paciente voltar a ter dores e fizer outra trombose que se foda. Está bem, está.

21.6.10

Esquemas

Ando a pensar nisto desde sexta-feira,  perturbou-me o contacto que tive através da rede social, tive um acesso de raiva e limpei tudo o que tinha na rede social, só lá deixei a minha fronha e mais nada, não há qualquer informação, acabou. E só não fecho a conta porque lá estão familiares com os quais contacto através daquilo, os miúdos. Ninguém me tira da ideia que este indivíduo tropeçou no meu perfil, verificou que já não sou casada e pensou aquilo que a maioria dos homens pensa. Então esta gaja divorciou-se? Agora quer é rambóia. Vejamos, se a situação fosse outra ao contactar-me teria tido uma atitude completamente diferente, se fosse alguém apenas a contactar um velho conhecido teria tido outro discurso, e se a rede social não fosse um esquema estaria visível a fotografia dele e o estado civil. Uma pessoa que é casada e não usa aquilo para engate não tem qualquer problema em revelar que é casada. Se bem que também as há que lá põem que são casadas e usam aquilo para engatar na mesma. Mas, se fosse livre também lá colocaria que é livre, como eu fiz. E se não fosse esquema não teria colocado um comentário no meu perfil dizendo "confirmo que continuas impressionante". Ora esta frase para mim, é frase de engate, ou não? Daqui concluo que o fulano é casado e quer saltar-me para a espinha, portanto o que tenho a fazer é cortar o mal pela raíz e não dar seguimento. Já não vou sequer tentar apurar rigorosamente nada, qualquer aproximação é demasiado perigosa, conheço perfeitamente o efeito que ele causa em mim. Foge mulher, foge!

20.6.10

A sério que não queria nada disto

Há um gajo que me ficou atravessado, e quando é assim é uma merda. Este gajo existiu na minha vida era eu ainda muito verde contudo parecia que tínhamos íman. Era uma coisa realmente extraordinária, inexplicavel, hoje diria animalesca. Os anos passaram e perdemo-nos o rasto. Durante este tempo todo, ora deixa-me fazer as contas, a menina aqui tinha 17 anos e ele 23, portanto passaram 17 anos e significa que este indivíduo tem agora 40 anos. Nestes 17 anos falei com ele apenas duas vezes apesar de o ter avistado e ele a mim mais algumas vezes na rua. O estranho (ou não) é que das duas vezes que falamos, aquelas conversas casuais de quem vai na rua e de repente encontra uma pessoa que não vê há anos, então tudo bem, e como estás, e o que estás a fazer agora, ok, felicidades, gostei muito de te ver, até à proxima, mais ou menos isto, eu sentia uma puta duma dor de barriga durante todos os segundos perto dele, olhámo-nos sempre nos olhos, eu a ler nos olhos dele um comia-te já aqui e estou convencida que ele a ler exactamente a mesma coisa nos meus. Animalesco. Sucede que eu era casada, um facto incontornável e está tudo dito. A segunda vez que me deparei com ele à minha frente ele deu-me o número de telefone dele, que eu nunca usei  e que francamente acho que perdi quando mudei de número por altura do divórcio. Vi-o algum tempo depois, empurrando um carrinho de bébé e com uma jovem ao lado que deduzi ser a esposa. É verdade que sempre soube que haveria de cruzar-me com ele novamente um dia, é verdade já o vi algumas vezes de longe na rua, depois do divórcio, é verdade que já pensei nele, mas aquele carrinho de bébé e a jovem que o acompanhava são altamente esclarecedores, proibem-me de sequer colocar a hipótese de entrar em contacto com ele e verdade seja dita, não me incomoda nada que esta figura esteja só no esquecimento e diluída no charco das recordações da juventude. A puta da merda toda é que este gajo me contactou há 2 dias, através de uma destas redes sociais virtuais. Grande merda. Não faço ideia do que é a vida dele neste momento, se está casado ou não, não faço a menor ideia. Também não faço ideia se vou ter força para lhe fugir.

19.6.10

Fuga

Apetece-me fugir. Tive aqui há tempos um projecto que me sugou até ao tutano. Foi um cliente enorme que nos veio cair no colo (isto soa um nadinha mal, mas...) e foi o cabo dos trabalhos. Uma cadeia de lojas gigantesca compra cerca de 100.000.000 (sim, cem milhões) de peças por ano incluindo vesturário, calçado, acessórios e produtos de cosmética. O objectivo da empresa onde trabalho era na altura conseguir entre 5 a 10% da produção de vestuário deste cliente. Bem bom. Trabalhamos como mulas, eu e mais 3 colegas neste projecto e fizemos uma primeira estação muito boa, foi até uma estação do caralho, suámos as estopinhas mas as putas das encomendas confirmaram-se e entregaram-se. Não fosse o caso de tudo o que se produziu ter sido na Ásia, que tem diferenças horárias que nos fizeram trabalhar muitas noitinhas, e não fossem as compradoras do cliente tão burrinhas que nos obrigaram a trabalhar como se estivessemos a lidar com deficientes mentais, acho que até teria sido mais fácil pois pelo menos não teriam a puta da mania que são finos o que já é mais de meio caminho andado, e a coisa teria sido um sucesso total. Assim só foi sucesso para o boss, que se fartou de ganhar dinheiro e as mouras a dar o corpinho ao manifesto e a cabeça à porrada. Depois veio a crise mundial, o colapso dos mercados financeiros, a queda a pique do dólar estavamos nós já a meio da segunda estação. Foi o fim da macacada, obviamente. Lá foram à vidinha deles, receberam as mercadorias e nunca mais ninguém os viu, não sem antes terem tentado anular encomendas por causa da crise mundial. A puta da crise mundial foi desculpa para alguns procedimentos nada éticos da parte deles, mas conseguimos travar a maioria. E apetece-me fugir porquê? Porque este queridíssimo cliente voltou. O dólar arrebita cachimbo e lá vêm eles outra vez. Estão à rasca, além disso. Precisam de um determinado tipo de mercadoria que não conseguem nem fazer bem, nem rápidamente, e de quem se lembram eles? Pois. Dos portugueses, que até têm escritórios de sourcing na Ásia e têm gajas portuguesas a supervisionar e a servir de único contacto o que dá um bocadinho de jeito, convenhamos. De maneiras que, dada a sofreguidão com que eles querem trabalhar connosco, não me admira nada que o boss, apesar de já ter avisado toda a gente que o ritmo desta vez terá de ser completamente diferente, e que as maratonas de trabalho pela noite dentro estão fora de questão, quando começar a ver os números nas encomendas embarque outra vez na paranóia. Só tenho de dizer uma coisinha, este projecto valeu-me a mim e à minha colega uma viagem à Tailândia, com direito a uma semana de trabalho exaustivo nos nossos escritórios de Bangkok, a sede do sourcing na Ásia,  e o fim-de-semana em casa da sócia do boss em Puhket, pronto, um sonho. Só me apetece fugir, se a coisa começar a ficar insuportável, vou ver as fotos daquele fim de semana. Fica já aqui uma, só para me acalmar um bocadinho.



Ok, outra que ainda estou um bocado alterada.



E a última, só para ficar bem disposta



Ah, estou muito melhor!