13.9.09

Diva

A voz destacou-se das outras. Era suave mas límpida. Não era estridente, contudo destacava-se das outras. Olhei a tentar descortinar a dona daquela voz. A figura também se destacava das outras. Alta e esguia, elegante. O cabelo grisalho apanhado na nuca, ligeiramente ondulado. A pele, morena e as rugas, profundas. A cabeça inclinada para trás, o pescoço esticado para melhor sair a voz. Desdentada, 2 ou 3 dentes naquela boca, que indiferente à falta deles cantava. Imaginei-lhe as mãos, imaginei-as grossas e endurecidas pela enxada e pela terra. Depois vi-as e eram finas, delicadas. A saia direita azul marinho, austera, a contrastar com o azul turquesa e branco das riscas da blusa, a cor garrida talvez uma nota de alguma irreverência. E cantava, cantava com a expressão que só um punhado de pessoas tem, a expressão de quem canta com amor. Cantava como se não houvesse amanhã. E voltei a perder-me na minha imaginação. Aquela mulher tinha o porte de uma actriz de cinema. Tinha o porte de quem poderia ter sido tratada como uma diva, como uma princesa. Teria um sorriso perfeito, teria a pele bem tratada e maquilhada, teria as melhores roupas e as melhores jóias. O porte e a elegância, esses não seriam adquiridos, ela já os tinha. Mas pergunto-me, teria sido mais feliz?

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