11.10.09

Crias

Tenho duas, já cresciditas. Bem fixes. Embarquei na maternidade não por sentir aquelas tretas do relógio biológico, mas porque fazia sentido passar à fase seguinte. Nunca fui do tipo maternal que faz festas a todas as criancinhas que passam, aliás sempre tive pouca paciência. Mas ok, alinhei. Tive medo, claro que tive. Tive medo de não estar à altura, de não conseguir fazer depois tudo o que se exige a uma mãe sem me sentir contrariada ou irritada, tive medo de acabar por culpar a criancinha pelo meu mau humor. Tive medo de não acordar de noite (sempre dormi como uma pedra). Tive medo de me esquecer das horas de comer. Tive medo de, basicamente, não saber tratar da minha cria devidamente. E, como imagino que todas as mulheres façam partilhei os meus receios com a minha mãe. A todas as questões a única resposta que tive foi um "Não te preocupes com isso" perfeitamente despreocupado. Admito que me irritava esta resposta. Em vez de me acalmar só me irritava ainda mais. A minha primeira grande surpresa foi ter decidido instintivamente escolher o parto normal e natural, à moda antiga. Dentro de mim sabia que queria experimentar o que desde há milhares de anos todas as fêmeas experimentam, parir. Assim sem paneleirices, parir. E parir é um fenómeno. Não encontro outra palavra para melhor definir o que é parir, é simplesmente um fenómeno. Para mim foi, porque operou dentro de mim tal mudança que não tem explicação, nem racional, nem emocional. Mas esta mudança teve o seu espaço exclusivo, deu-se dentro de um território próprio. Um país que nasceu dentro de outro país, com as fronteiras claramente definidas e fechadas. Ao mesmo tempo que nasceu a criança nasceu a mãe. Ao contrário da criança a mãe nasceu completamente preparada, com todas as ferramentas para tratar da cria, e com a habilidade para as usar. Veio com tudo incluido. Esta foi a segunda surpresa. E isto nada mais é do que o instinto da fêmea que protege a sua cria. Nada mais. Básico, e simples. A terceira surpresa foi ver-me a fazer tudo, tudo mesmo, com uma leveza e prazer extraordinários. Nunca contrariada, nunca aborrecida. Com a vida virada de pernas para o ar, com uma criatura que domina e absorve todos os detalhes que se possam imaginar, e a fêmea ali, sem parar, sem respirar, a vigiar a cria, e na maior. Estão ali, as duas crias no sofá a ver televisão. A mãe prepara-lhes o pequeno-almoço e leva-lhes, e enquanto as crias se alimentam a mãe escreve sobre elas e sobre o que elas lhe fizeram, e na maior.

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