22.2.11
Dona Rosa
Dona Rosa enviuvou aos cinquenta e cinco anos. Dona Rosa, muito senhora do seu nariz resolve casar-se com o Senhor Antunes, senhor muito respeitável, de boa apresentação, asseado e educado, cristão católico e praticante, uma boa reforma, enfim, tudo o que se pretende encontrar num marido ideal para combater a solidão dos anos dourados da vida de uma pessoa. Pois casam-se Dona Rosa e o Senhor Antunes, e dos cinco filhos de Dona Rosa, três zangam-se. O Senhor Antunes não teve filhos com a sua falecida esposa. As duas filhas que se conformaram o segundo casamento da mãe estão hoje perante um grande problema nas suas vidas. Passaram-se vinte anos desde que a mãe se casou. Ouvem-na agora queixar-se que não consegue aturar o Senhor Antunes, que é um chato e que não pode mais. O Senhor Antunes, coitado, confessa que Dona Rosa, hipocondríaca de primeira linha, mimada e caprichosa, lhe dá cabo do juízo. Estão velhos, Dona Rosa e Senhor Antunes, já não deviam estar sós. E as filhas? Não se chegam? A mais nova entende que a mais velha, que já não trabalha terá mais disponibilidade para tomar conta dos velhotes. A mais velha reclama que se fosse só a mãe a levaria para sua casa, mas o padrasto... isso não, tem a filha já casada a viver noutra cidade, desvia-se do problema e vai passar longas temporadas em casa da filha. A mais nova, vive num apartamento no oitavo andar, os velhotes não querem ir para lá. Dizem as más línguas, Dona Rosa, muito senhora do seu nariz, casou-se sem precisar da licença de ninguém, não escutou ninguém, agora que está doente e farta do marido, que se desunhe. Dona Rosa nunca cultivou o afecto dos filhos, nunca esteve disponível para ajudar fosse no que fosse, sempre independente e senhora do seu nariz. Sempre com a língua afiada, nunca murmurou um mimo, nem aos filhos, nem aos netos. Dona Rosa colhe agora o que ao longo da vida semeou, não espere carinho quem nunca acarinhou.
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3 comentários:
Deviam pôr este post ao lado da definição de "justiça" no dicionário.
Dá que pensar, pelo menos.
Achei este post de uma enorme coragem.
Exactamente, o facto de se ser filho não quer dizer, automaticamente, que se ama ou se deve "tomar conta de".
A obrigação é dos pais, e quando essa não funcionou não peçam, nem esperem que os filhos a tenham.
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